Páginas

sábado, 25 de junho de 2011

Doença Rara

Eu tenho uma doença rara que me impede de dormir a noite.
Quando deito na cama para repousar, seus sintomas me atacam e passo por uma metamorfose. Em vez de dormir para sonhar, eu sonho acordado. É nessa hora que nascem asas nas minhas costas e eu posso voar. Minhas pernas e meus braços se fortalecem e eu posso enfrentar todos os problemas. De repente, já não sou mais eu.
Nenhum médico ainda foi capaz de diagnosticar que doença é essa. As drogas mais poderosas foram incapazes de deter a transformação. Não consigo me lembrar se nasci assim, ou se ela se desenvolveu com o tempo, só me lembro de todas as noites em que sofri com essa doença.
É algo que não consigo explicar com palavras. Gestos também não ajudam. É provável, porém, que consiga me entender ao olhar nos meus olhos. Talvez você consiga sentir a dor e a força que sinto quando as asas crescem. De um simples ser humano, para um monstro, uma aberração.
Se você me visse transformado, não ia mais esquecer daquilo em que me torno. O espanto e o horror poderiam se apoderar da sua respiração e bloquear seus pensamentos por um tempo. Talvez, você fosse controlado pela minha mente. Possivelmente, se apaixonaria... Não sei, acho que não. Ninguém se apaixona por um monstro alado.
Mas ainda não lhe disse o lado bom dessa doença.
Quando estou transformado, meus pensamentos são o meu maior poder. Com a força dele, consigo construir castelos ou destruir muralhas. Minha imaginação se potencializa. Tudo, subtamente, se torna possível. Quando isso acontece, me esqueço da aparência horrível, das penas negras e das garras. Com o poder do meu pensamento consigo me acalmar gradativamente. Quado começo a criar com minha mente, as asas diminuem aos poucos, até desaparecerem. As garras voltam a ser dedos e meu corpo é o mesmo outra vez. Por fim, após uma luta terrível entre o monstro e o gênio, adormeço.
Embora os dias pareçam não mudar, dentro de mim, sei que não sou mais o mesmo. A cada noite, essa metamorfose me torna em alguém diferente. As experiencias do dia não são nada comparadas aos devaneios noturnos...
Como te disse, ainda não sei se essa doença é contagiosa. Mas, por precaução, sugiro não se aproximar muito. É mais seguro manter distância. Ou, se você gosta de se arriscar, se deseja sentir o poder fluindo em você, o melhor a fazer é olhar fixamente e demoradamente nos meus olhos. Por um momento consigo fazer você se transformar também. Seu pensamento voará com o meu e conseguirá enxergar mais longe do que já conseguiu.
Sinto vergonha do monstro em que me torno, mas ele faz parte da minha vida. Sem o monstro, não há o gênio. Sem a plumagem escura e as unhas afiadas, não há poder. Me acostumei com isso e acho até que gosto um pouco da metamorfose. Pra dizer a verdade, espero ansiosamente para me deitar todas as noites. Já sei que eu tenho uma doença rara, e não me preocupo se ela me impede de dormir a noite, pois é ela que me ajuda a acordar de manhã.

JP - Escrito hoje, ao acordar...

Nenhum comentário:

Postar um comentário